
Roger Schmidt falou da experiência que tem vivido nestes primeiros meses como treinador do Benfica.
«Como amante de futebol, se falarmos de grandes clubes, o Benfica é um deles. Está ao mesmo nível do Real Madrid, do Barcelona… é o expoente máximo do futebol. Historicamente e em termos de dimensão é muito especial. Não houve ninguém a comprá-lo por quatro mil milhões de euros, nem a injetar aqui dinheiro. É um clube em que as pessoas poupam dinheiro todos os meses para poder ir ao estádio. É um clube que tem de vender jogadores para poder funcionar. É um clube com 20 modalidades diferentes que toda a gente acompanha com paixão. O Benfica sente-se ao fim de um tempo», disse à Benfica Play.
«Quando surgiu o interesse do Benfica, depois de decidir sair do PSV Eindhoven, a proposta surgiu muito depressa e eu pensei ‘o Benfica é muito interessante’. E depois durante as negociações ficou claro que era o que queria fazer», acrescentou, antes de dar mais detalhes sobre as negociações:
«Foram com Lourenço Coelho e Rui Costa. Eles estavam muito convencidos, até fiquei espantado com a certeza que tinham de que eu era o treinador certo porque é uma decisão de muita coragem – um treinador germânico – não português. Há muito tempo que não tinham um estrangeiro. É claro que as pessoas são avaliadas consoante os resultados, mas eles estavam muito convencidos. Até fiquei surpreendido e esse foi o último elemento para eu tomar a decisão.»
«Quando se está no Benfica, todos os anos temos de tentar vencer títulos. Faz parte da história do clube e é o que esperam de nós. Há três anos que o clube não ganha qualquer título – campeonato ou taças – e as expectativas são altas, naturalmente. Agora tem de ser. Temos de fazer por isso. Mas não estou a pensar se será ou não o meu ano mais bem-sucedido. Estou concentrado no presente, no trabalho diário», rematou.
Declarações de Roger Schmidt, treinador do Benfica, em entrevista ao jornal alemão Der Spiegel.
Retrospetiva carreira:
«Nem tenho tempo para olhar para trás. Pensando bem, 2014 foi há oito anos e meio. Entretanto aconteceram muitas coisas. Já estive na China, nos Países Baixos e agora estou em Portugal. No futebol o tempo passa muito depressa. Até porque, no dia a dia, estamos concentrados no aqui e agora. Há ciosa para pensar e decidir e o resto pouco importa, quase não temos tempo para olhar para trás. Durante a temporada parece uma eternidade, é como uma montanha gigante que temos de escalar. Quando chega o fim, pensamos onde foi parar tudo o que aconteceu.»
Estilo de jogo:
«Para ser sincero, nunca li um livro sobre futebol. Até podia ser interessante, mas nunca tive tempo e nunca me pareceu importante. Sempre tentei desenvolver-me no trabalho diário e usar as minhas experiências para encontrar as melhores formas para fazer com que as minhas equipas evoluam. Já fiz vários níveis (de cursos de treinador), isso para mim foi importante. Também tive a possibilidade de acumular experiências, até em vários países, e ao mais alto nível até na Liga dos Campeões. Temos a possibilidade de jogar contra grandes equipas e tentamos jogar à nossa maneira. Se se ganha sempre ou não, isso é outra história. Com todo o respeito pelo adversário, mas durante a maior parte dos 90 minutos devemos jogar como queremos e não como o adversário quer.»
Filosofia:
«Primeiro apareceu o amor pelo futebol. Já amava o futebol, em pequeno jogava na rua. Não tive uma grande carreira – joguei na 3.ª divisão -, ainda assim, gostava de jogar todos os domingos. E nunca pensei que o futebol viesse a ser a minha profissão, nem nunca pensei que viria a ser treinador. Para mim isso era inconcebível. Quando comecei a trabalhar como treinador continuava a ser inconcebível. Era mais um passatempo. Ainda assim, o amor pelo futebol marcou-me tanto. Eu era avançado e a coisa mais bonita quando uma criança começa a jogar é o momento em que chega à baliza e marca um golo. No fundo tudo passa pelo golo. Ter a bola dentro da baliza. Quando David Neres faz um cruzamento e o João Mário encosta para o golo… esse é o momento pelo qual o estádio e todo e o público esperavam. A ideia de criar esses momentos marcou-me. Nunca acreditei em ficar à defesa à espera que, eventualmente, acontecesse algo na área adversária. Temos de agarrar o destino com as próprias mãos e aproveitar os 90 minutos para tentar ser melhor que o adversário, criar mais oportunidades. Não há vitórias garantidas, mas podemos aumentar as probabilidades de vencer. E isso só pode acontecer se tivermos uma abordagem ativa no futebol. Quando comecei a trabalhar como treinador não pensava muito nisso. Era uma coisa minha, que vinha de dentro. Fui dando passos na carreira de treinador, encontrado a forma de treinar os jogadores e de transmitir essa motivação, essa paixão. Depois, com a experiência, isso foi-se desenvolvendo e acabei por perceber que estava a resultar. E pensei: ‘É possível’. Quanto mais acreditas em ti, mais as coisas melhoram, mais os jogadores acreditam e, quando assim é, mais eles podem fazer a diferença. Mas antes dos jogadores, é preciso que sejamos nós a acreditar. É preciso encontrar esse caminho. Não sou um treinador que pensa que o estilo do adversário vai definir a nossa forma de jogar. Para mim isso é 100 por cento claro para os jogadores. Vejo como jogam os adversários, dou informações aos jogadores, mas nós jogamos à Benfica e jogamos para vencer.»

Identidade:
«É importante vencer título. (…) Fazemos tudo para que, no momento da consagração, possamos ter aquela sensação maravilhosa. Mas não me é indiferente a forma como chegamos lá. Quero chegar lá de uma forma que me agrade e em que possa dizer ‘gosto deste futebol’. Não há nenhum jogador na equipa do Benfica que não esteja a jogar bem. Para além dos títulos, essa é a maior alegria do futebol. Esse é o grande prazer no futebol, ver como todos jogam em campo e lutam como equipa.»
Aprender português:
«No início prometi que ia aprender, mas é complicado (risos). É uma língua muito difícil e seria um investimento temporal muito grande até saber o suficiente para dar treinos em português. Para falar bem, não me atrevo. Em inglês funciona bem. Gostaria de falar português e outras línguas, mas era preciso aprender mais novo (risos). Alguns jogadores não falam tão bem inglês e é preciso fazer uma interpretação, mas está tudo perfeitamente normalizado. Pode parecer complicado, mas estive dois anos na China onde ninguém fala inglês, tudo funciona através de interpretes. Noutros clubes também há jogadores que não falam a língua do país e não há qualquer problema.»
Cultura da equipa:
«Este é um grupo com muitas nacionalidades, muito misto. O treinador também tem uma palavra a dizer sobre o ambiente e a cultura da equipa. É preciso desenvolver uma cultura em que cada um se sinta valorizado, que consiga identificar-se com a equipa e dar o seu melhor. Ajuda quando há várias influências e mentalidades diferentes, mas a minha experiência é que a equipa cresce em conjunto. Não interessa se há muitos sul-americanos, ou outros, todos devem adequar-se a esta cultura conjunta para criar o espírito de equipa. Individualmente são responsáveis e exijo que eles assumam essa responsabilidade.»
Rendimento dos jogadores:
«Acredito que não conseguimos ter rendimento de um jogador apenas no momento que precisamos dele. Tem de ser preparado antes. Acontece ao longo de toda a temporada. É algo que precisa ser feito a título permanente para que nessas situações os jogadores representem soluções. Creio, enquanto treinador, que é preciso manter o plantel em forma psicológica, física e futebolística sempre ao nível máximo. Isso é um desafio para aqueles que não jogam sempre. Mas é possível valorizá-los, fazê-los sentir que fazem parte da equipa principal, explicar que naquele momento há jogadores à frente deles, mas que aparecerá uma oportunidade e que, nesse momento, têm de estar prontos. Isso passa pela cultura que se cria na equipa durante a época. Quanto melhor conseguirmos fazer isso, melhor preparados estarão os jogadores para o momento em que essa oportunidade surgir. Isso não tem a ver só com saídas, mas também com lesões, ou quebras de forma… é uma situação de concorrência e é o princípio do rendimento.»
«O clube tem grandes objetivos, luta para vencer títulos. Essa é a nossa responsabilidade e temos de dar alegrias aos adeptos. É preciso preparar os jogadores para estarem a um nível alto, e isso não funciona se nos concentrarmos apenas em onze jogadores. É claro que tem de existir uma equipa titular, mas temos de olhar sempre para o grupo como um todo. Se queremos vencer títulos, não podemos rer muitas fases de quebra, não podemos perder pontos. Para ganhar um título em Portugal são precisos 85 ou 90 pontos, ou seja, é preciso ganhar quase sempre. E isso só acontece quando todos os jogadores estão prontos para entrar independentemente do contexto. Lido com os jogadores da forma mais aberta possível, luto por eles, mas a partir do momento que assinam por outro clube passam à história e concentro-me no aqui e agora. Estou 100 por cento concentrado em preparar a equipa para cada jogo e nada mais me preocupa. Não ando a correr atrás de ninguém, nem tenho tempo para isso. Não faz sentido. Talvez haja quem o faça. Eu sou muito direto, talvez em virtude da minha experiência, e tento ocupar-me com aquilo que me permitirá vencer. Tudo o resto desaparece.»
Dinâmica da equipa:
«Antes do jogo contra o PSG disse que a preparação para esse jogo começou no primeiro dia da pré-época. Claro que o nível é diferente, fizemos um percurso, com todos os jogos que vamos fazendo e a experiência que vamos ganhando. Aproveitámos toda essa dinâmica que vinha desde a pré-época e vencemos todos os jogos. Começámos logo a jogar bem e a marcar muitos golos, criou-se uma dinâmica. Reparámos que esta equipa tinha muito potencial futebolístico, que aplicava as ideias. Era uma equipa muito motivada, muito profissional, mas também muito aberta a esta abordagem que é diferente da do ano passado. Vejo nos treinos que se divertem, mas também há uma grande qualidade futebolística. E é aí que podemos marcar a diferença. No Benfica temos uma equipa com muito potencial.»